Graffiti Histórico e Casos de Estudo - I Parte - Folk Religion

Figura 1




Índice

I Parte
1 - Introdução
2 - Graffiti uma definição
2.1 - Marcas e Mensagem
2.2 - Graffiti "Marginal" versus  Epigrafes e Arte "Oficiais"
3 - Funções e Categorias
5 - O Problema da Datação
4 - Os nossos estudos sobre Ideogramas Mágico Religiosos
Bibliografia

II Parte (em construção)
5 - Concelho de Alandroal
Santuário do Castelinho, Santuário de NS da Boa Nova, Ermida de Santo António de Capelins, Ermida de S Pedro de Terena, Aldeia das Hortinhas, Vila de Alandroal, Ribeira de Lucefécit e Moinhos
6 - Concelho de Reguengos de Monsaraz
Serra das Pedras, Arrabaldes de Monsaraz, Ermida de Santa Catarina, Vila de Monsaraz, Aldeia de S Pedro do Corval
7 - Concelho de Évora
Sé Catedral, Convento de S Francisco, Aqueduto da Água de Prata, Castelo de Valongo, Templo Romano e Moinhos
Bibliografia

III Parte (em construção)
8 - Concelho de Estremoz
Santuário de Santa Maria. Torre de Menagem, Paços do Concelho Medievais, Cidade de Estremoz, Vila de Évoramonte
9 - Concelho de Vila Viçosa
Forte Abaluartado, Muralhas Medievais, Porta de Estremoz, Santuário de NS da Conceição, Vila Viçosa
10 - Concelho de Mourão
Santuário de NS das Candeias, Aldeia da Luz e Moinhos
11 - Concelho de Elvas
Torre de Menagem, Cidade de Elvas e Forte da Graça
12 - Outros Concelhos
Concelhos de Redondo, Portel, Arraiolos e Montemor-o-Novo
Bibliografia


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I Parte


1. Introdução


    Em 2011 viemos viver para a Aldeia da Venda na Raia alentejana. Fomos muito bem recebidos pelo vizinhos, descobrimos um céu enorme e que há sempre tempo para tudo. É só desacelerar um bocadinho. Lentamente temos sido apresentados a um mundo escondido à vista de todos. Um mundo que não se vê quando se anda a correr de um lado para o outro. É preciso olhar, voltar a olhar, se tivermos sorte, se a luz estiver no ângulo certo, lá vemos o uns riscos. Estes são vozes de um passado que não está nos livros de História. O Graffiti Histórico é feito de Ideogramas Mágico Religiosos, de Fórmulas Mágicas, de Mouras Encantadas, de Seres Mitológicos, de Rezas e Maldições.....de preocupações antigas que também são as nossas.
    O Graffiti acompanha o Homem desde a Pré-História. Encontramos na Arte Rupestre as primeiras representações, por vezes únicas, de como funcionava a cabeça dos nossos antepassados. Percebe-se assim a importância da Arte Pré-Histórica. Arte que era também Magia, Religião e até Ciência. Os painéis rupestres são livros milenares escritos na pedra. Compreende-se assim que a Arte Rupestre pare a construção de Barragens. Para períodos recuados este "Graffiti" é reconhecido e valorizado. Nos nossos dias o Graffiti enquanto Arte está bem vivo. Em Portugal temos mesmo uma "Geração de Ouro". Artistas como VHILS e Odeith elevam as suas formas de expressão a patamares reconhecidos internacionalmente. Graffiti que tem sempre uma mensagem nem que seja apenas o nome do artista ou "tag". E quantos "tags" estão escondidos na Arte Rupestre por vezes na forma de uma simples mão. O Graffiti tem uma incrível continuidade. Há rochas onde o Homem vem "escrevendo" há milhares de anos. Rochas em que todo o espaço está preenchido por formas que se sobrepõem. "Puzzles" que têm que ser desmontados peça a peça. Um espetacular desafio para os investigadores. Encontramos nesta continuidade a importância do Graffiti. É uma autêntica máquina do tempo que nos permite compreender mundos antigos que ainda estão vivos.
    Infelizmente muito do Graffiti, senão a maior parte, está em risco de desaparecer. No espaço de uma ou duas gerações pouco restará. Este importante registo é de difícil identificação e dificílissima interpretação. São riscos e picotados muito ténues que se escondem da vista. O Graffiti quando identificado é muitas vezes desvalorizado e interpretado como brincadeiras de crianças, como momentos de ócio, simples figuras geométricas e florais decorativas ou tabuleiros de jogo. Concordamos que o Graffiti seja tudo isto. E todos estes aspetos da vida são importantes merecendo registo e estudo. No entanto temos vindo a compreender que grande parte do Graffiti é muito mais. Esta desvalorização do Graffiti enquanto documento é gravíssima. Por vezes são as próprias obras de renovação dos monumentos a destruir esta imensa fonte de informação. É urgente que o acompanhamento de obras em monumentos ou edifícios históricos tenham em conta o Graffiti.
    Encontramos nas obras de Arte que embelezam Palácios e Igrejas, nas Artes decorativas que embelezam vários estilos arquitetónicos, nas Epigrafes que nos dizem quem mandou fazer ou relatam os mais variados episódios, o discurso "oficial". O discurso do poder, do Rei, do Estado, da Igreja e dos Senhores. Uma visão das elites que é um retrato parcial das sociedades históricas. 
    O Graffiti é um documento histórico que podemos chamar de "marginal". São as impressões de quem não tinha posses para pagar Epigrafes ou quem não sabia escrever. As gentes comuns, o povo, você e eu. Nas paredes de fortificações e igrejas, nas portas e chaminés de casas comuns, nas fontes e moinhos, em afloramentos rochosos encontramos a voz dos esquecidos. Riscados, desenhados ou picados encontramos um sem número de Grafitos. Estes representam superstições que são reflexo das preocupações do dia a dia, de episódios trágicos ou do medo do desconhecido. Estes "medos", assim como o Graffiti, acompanham o Homem desde sempre.
    Deixo as palavras de Matthew Champion na introdução do seu "Medieval Graffiti":
    "....The coloured glass of the medieval church window and the dull brasses laid to marble upon the floor rarely carry images of peasant ploughing - they show instead the rich lords of the manor in all their finery (...)
    The images and texts that are inscribed into the very stones of the church bulding can often tell us far more about the medieval people who worshipped there than any amount brightly coloured stained glass (...)
(...) the medieval graffiti that we discover in chrches today tell us about all aspects of the medieval world. It tells tales of grief and loss, of love and humour. At times, it speaks to us of religious devotion and fear od damnation. It carries names of long-dead children across the centuries, records happy days of pageants and celebration...."
    É no Graffiti que vamos encontrar o "retrato" de Gonçalo Fernandes no Castelo de Arraiolos (Figura 2 retirada de Branco e Bilou 2010). Deixamos as palavras dos autores sobre este Grafito:
    "Mais incomum é o «retrato», como este de Gonçalo Fernandes, aqui fixado para a posteridade (foto 5). Apesar do traço ingénuo, é possível fixar o essencial da imagem deste pedreiro de Évora, que em 1385 veio levantar doze ameias e «castelonas» na fortaleza de Arraiolos e de quem não conhecemos nenhuma outra obra ou notícia: era um homem novo, sem barba e com cabelos compridos…....".


Figura 2


    O objetivo deste Post é alertar para a existência do vasto mundo do Graffiti e da sua importância. Com este propósito vamos apresentar uma tentativa de definição na I Parte. "Tentativa" porque é um campo pioneiro, muito vasto onde os estudos são poucos. Será portanto uma definição sempre em construção. Vamos completar a definição de Graffiti dentro de dois "extremos". Por um lado a diferença entre Graffiti e várias "marcas" sem mensagem. Por outro lado a diferença entre o "marginal" Graffiti e as "oficiais" Epigrafes e Arte.
    Nesta I Parte apresentamos também os nossos estudos sobre Ideogramas Mágico Religiosos Começámos por estudar Tabuleiros de Jogo no Concelho de Alandroal. Estudámos os Ideogramas que surgem na Chaminés alentejanas desempenhando uma função apotropaica. Continuámos o estudo dos Ideogramas no resto da casa alentejana onde estão por todo o lado. Ligado a este tema estamos a investigar o fenómeno das "covinhas" e das Rochas Sagradas. A ver se publicamos também os Ideogramas por tipo começando pelas "estrelas". Estas estrelas são o Pentagrama, o Hexagrama e o Octagrama usados até hoje no Alentejo.
    Nos nossos estudos tentamos também combater alguns "mitos urbanos".
- O mito dos Cruciformes nas ombreiras de portas estarem ligados a judeus ou cristãos-novos. São muitos e diferentes os Ideogramas que surgem nas ombreiras. esta tradição apotropaica é comum a todas as religiões.
- O mito que Pentagramas e Hexagramas são evidências da religião judaica. Estes Ideogramas foram e são usados por várias religiões por todo o globo com destaque para o Hinduísmo.
- O mito de que todos os Ideogramas geométricos que encontramos gravados em rochas e paredes, inclusive na vertical, são tabuleiros de jogo. Estes Ideogramas Mágico Religiosos são conhecidos desde a Idade do Ferro e ainda são usados na Raia alentejana.
    Os nossos estudos incidem principalmente sobre o que chamamos de Ideogramas Mágico Religiosos No entanto temos encontrado muitas outras formas de Graffiti Histórico por esse Alentejo fora. As II e III Partes deste Post pretendem apresentar este Graffiti por  Concelho e sítio. Encontramos quadros religiosos, pedidos e confissões, barcos e palácios, animais e flores, mãos e pés, marcas de canteiro e traçarias, relógios de sol e medidas, assinaturas e datas, heráldica e anagramas...... 
    Este Post é um ponto de partida. A ver se temos forças para continuar e inspirar outros a fazerem estes levantamentos nas suas terras. Um dia, quem sabe, talvez consigamos, criar um "Corpus" do Graffiti em Portugal.
    Na Figura 3 temos a "Cueva de las Manos" na Argentina com Arte Rupestre de há 10000 anos.
    Na Figura 4 apresentamos a "mão" enquanto Ideograma Mágico Religioso. A mão surge desde a Arte Rupestre da Pré-História até ao Graffiti Histórico do nosso Alentejo. Encontramos a mão em adros de Ermidas rurais, em poços, balcões, paredes de montes...... Surge desenhada, riscada ou impressa no estuque. É quase sempre mão esuqerda. Por vezes está associada a outros Ideogramas Mágico Religiosos e muitas vezes a Ideogramas Geométricos. Assim se assinava um pedido aos deuses em tempos que pouco sabiam escrever. A mão como selo pessoal.


Figura 3

Figura 4


    Não encontramos em Portugal levantamentos sistematizados sobre Graffiti Histórico. Existem alguns trabalhos que se dedicam ao estudo do Graffiti de um monumento, de uma tipologia ou surgem dentro de trabalhos mais vastos.
    Gostávamos de destacar o trabalho de Orlindo Jorge sobre o Graffiti do Mosteiro da Batalha. Um trabalho muito interessante sobre a "Catedral" do Graffiti português. 
    Encontramos alguns trabalhos sobre o Graffiti de Castelos nomeadamente Arraiolos, Amieira do Tejo,  Montemor-o-Velho ou sobre o Castelo da Cidade Franca de Olivença.
    Encontramos alguns levantamentos de Graffiti inserido noutros trabalhos principalmente no que toca ao Património Molinológico. Destacamos o levantamento dos moinhos realizado antes da subida das águas de Alqueva. O trabalho de Manuel Nunes e Paulo Lemos sobre o Graffiti dos Moinhos do Concelho de Lousada também é muito interessante.
    No estudo dos Ideogramas Mágico Religiosos o "Signum Salomonis" de Leite da Vasconcelos é um ponto de partida. Esta obra apresenta o Pentagrama, o Hexagrama e o Octagrama dentro das suas funções e com vários registos etnográficos. Um clássico.
    As ombreiras de portas também têm tido alguns levantamentos no que toca aos Ideogramas. Baseamos muito do nosso trabalho nos pioneiros levantamentos, das ombreiras das portas, realizados por Carmen Balesteros e equipa. Infelizmente muitos dos levantamento focam-se somente nos Cruciformes.
    Os Tabuleiros de Jogo foram estudados por alguns autores com destaque para Lídia Fernandes e o seu "Testemunhos de Jogo inscritos na Pedra". Esta autora interpreta como Tabuleiros de jogo muitos Ideogramas Mágico Religiosos. Apesar de estes surgirem na vertical, de estarem associados a outros Ideogramas com reconhecidas funções mágico religiosas ou de terem terem dimensões ou formas "estranhas". Um preconceito que pretendemos desmontar AQUI.
    A maior base de dados e centro de estudos sobre o tema dos tabuleiros de jogo chega-nos de Itália. O "Centro Studi Triplice Cinta" de Marisa Uberti, e colaboradores, que aborda também os tabuleiros enquanto Ideogramas Mágico Religiosos.
    Na vizinha España encontramos o Site "Signos Lapidarios" de Rafael Fuster Ruiz. este dedica-se ao estudo e sistematização de Marcas de Canteiro mas vai muito para além deste tema.
    O mais interessante estudo sobre Grafitti Histórico chega-nos do Reino Unido com o "Norfolk Medieval Grafitti Survey". A partir deste projecto nasceu o livro de Matthew Champion "Medieval Graffiti". Um livro que se recomenda a quem queira estudar ou conhecer o mundo do Graffiti Histórico.
    A Internet tem sido uma ferramenta essencial no estudo deste tema. Gostávamos de destacar dois Grupos do Facebook onde se partilham muitos e bons exemplos de Graffiti. O Grupo "English Medieval Grafitti" e o grupo "Marcas de canteria, estelas discodailes, grafitos e otros gliptogramas".
    Gostávamos de agradecer também a todos os amigos que partilharam connosco as suas descobertas. Este Post resulta de um imenso trabalho de equipa.
    Os monumentos e sitios apresentado na II e III Partes mereciam um estudo mais aprofundado. Gostariamos de ter tempo e dinheiro para fazer o levantamento cientifico e exaustivo do Graffiti. Fotografá-lo com escala e luz rasante, desenhar e tratar em computador toda esta informação cheia de interessantes detalhes. Enfim sem qualquer apoio do Estado, ou institucional, faz-se o que se pode. Esperamos que do nosso trabalho nasça algo mais.
    Na Figura 5 apresentamos um documento de apoio do site "Norfolk Medieval Graffiti Survey" sobre "Compass Drawn Tipology".
    Na Figura 6 apresentamos alguns Ideogramas Mágico Religiosos "desenhados a compasso" que encontramos na nossa região. Temos Rosetas Hexapétalas que em conjunto formam a Flor da Vida, a Suástica Lauburu e Cruciformes. Vamos encontrar estes Ideogramas em Chaminés, na casa alentejana, estruturas da arquitetura vernacular, em artefactos vários e em afloramento rochosos...


Figura 5

Figura 6



2. Graffiti uma definição


2.1. Marcas e Mensagem


    Entendemos Graffiti (no plural), Graffito (no singular), ou Grafito (simplificado) como mensagens pintadas, desenhadas, raspadas, pressionadas, incisas ou picotadas em suportes pétreos, argamassas, rebocos e estuques, cerâmicas, vidros, metais e madeiras tanto em ambientes naturais como em todo o tipo de construções desde a Pré-História. Um mundo imenso.... Vamos lá tentar diminuir o nosso mundo do Graffiti.
    O Graffiti esconde sempre uma mensagem quer a compreendamos ou não. Mesmo que seja um "tag" sem graça nenhuma. Não podemos considerar como Graffiti:
- As várias decorações em relevo que encontramos frequentemente em elementos pétreos. Damos como exemplo a decoração conhecida por pedras "almofadadas".
- As marcas acidentais ou resultantes de impactos vários. Marcas de raspagem de veículos em partes de estruturas várias. Marcas impacto de projeteis vários em estruturas defensivas.
- As marcas da lavra dos elementos construtivos ou os encaixes entre os diversos elementos das estruturas. Marcas de encaixe dos rodízios e trancas em portas e janelas. Marcas nos elementos pétreos para encaixe das tenazes usadas no transporte. (Figura 7)
- As picagens que são feitas antes de aplicar um novo estuque (Figura 8).
- Marcas em pisos pétreos que funcionam como "anti-derrapante" muito confundidas com tabuleiros de jogo (Figura 8).
- As marcas que são resultado da realização de uma tarefa sobre os suportes. Damos como exemplo as marcas de afiar objetos metálicos que encontramos nas ombreiras das portas (Figura 9).
    Manuel Duran Fuentes na sua obra "Marcas e Graffitos en obras públicas romanas" faz a seguinte tipologia para construções pétreas. Este artigo é muito interessante para perceber a variedade de "marcas" do mundo romano que não são Graffiti. Para este autor só vamos encontrar Graffiti no ponto 7:
1- La huellas (marcas, texturas, muescas, agujeros, etc) construtivas:
1.1 - Procedentes de la extracción de cantera
1.2 - Auxiliares para la colocación de los silares
1.3 - Resultantes de los trabajos de labra
1.4 - Para facilitar el processo construtivo y la trabazón de la fábrica
2 - Marcas de cantero y otras identificativas
3 - Los relieves o grabados de tipo artistico, simbólico o utilitário
4 - Las marcas de replanteo
5 - Los juegos
6 - Los aguzaderos y ataderos
7 - Los grafitos


Figura 7

Figura 8

Figura 9



2.2. Graffiti "Marginal" versus  Epigrafia e Arte "Oficiais"


Epigrafes


    É importante fazer a distinção entre as Epigrafes "oficiais" e o Graffiti "marginal". Nas Epigrafes encontramos a mensagem das classes dirigentes. Encontramos imortalizados os nomes e famílias dos mais abastados. Aqueles que podiam pagar a pedra, pagar o trabalho da inscrição e pagar o monumento onde a Epigrafe chegou até aos nossos dias. Nas Epigrafes "oficiais" encontramos o registo de obras realizadas e de eventos que glorificam as classes mais altas. No Graffiti "marginal" temos voz da gente comum. Compreendemos preocupações do dia-a-dia que ainda são as nossas. É também através do Graffiti que compreendemos a continuidade da religião popular.
    Por vezes esta fronteira entre o Graffiti "marginal" e a Epigrafia "oficial" não é clara. Encontramos o carácter oficial das Epigrafes na linguagem, na localização, na nobreza dos materiais usados e forma como foram "lavrados". A linguagem das Epigrafes obedece a fórmulas conhecidas e é por vezes mais extensa. Estas localizam-se em lugares de destaque nas obras e muitas vezes bem lavradas no mármore. São muitas vezes o fóssil diretor para datar as construções e monumentos ou para identificar os indivíduos. O Graffiti é na maior parte das vezes uma assinatura, perdida no meio de outras e quase sempre em lugares escondidos. Também encontramos mensagens de carácter pessoal, curtas e em linguagem comum. Encontramos muitas vezes apenas apenas anagramas, acrónimos ou siglas.
    O mundo do Graffiti "marginal" é muito mais complexo que o mundo "regrado" das Epigrafes "oficiais". O estudo do Graffiti torna-se assim muito mais difícil. A datação de Graffiti é um autêntico quebra-cabeças. Num mesmo painel de Graffiti encontramos várias "camadas" de informação sobrepostas que fazem parte de "cenas" complexas. Um "puzzle" de linhas e significados que representam bem a mente humana.
    Na Figura 10 observamos várias Epigrafes no Concelho de Alandroal. A primeira é uma placa funerária romana dedicada ao Deus Endovélico localizada no Santuário de NS da Boa Nova. A segunda é uma das Epigrafes medievais do Castelo da Vila de Alandroal. A terceira celebra a construção da torre do Relógio também no Castelo da Vila de Alandroal. São todas documentos "oficiais", todas em Latim e duas delas em mármore.
    Na Figura 11 apresentamos vários exemplos de Graffiti. Na primeira imagem celebrando Deus, em arábico, no Castelo de Valongo no Concelho de  Évora. Na segunda imagem uma assinatura, ou fórmula, na escadaria da Sé de Évora. Na terceira uma assinatura, do século XVIII, no terraço da Torre de Menagem do Castelo de Estremoz.
    Na Figura 12 temos as várias "cenas" que surgem no Santuário do Castelinho na Ribeira de Lucefécit. Estas cenas têm sido refeitas ao longo dos tempos. O desgaste do xisto criou "nichos" neste autêntico "muro das lamentações". Na mesma Figura temos um desenho  de um painel de Graffiti onde observamos uma imensa complexidade (desenho retirado de Neves e Figueiredo 2015).


Figura 10

Figura 11

Figura 12





Arte


    As primeiras formas de Graffiti têm dezenas de milhares de anos e são conhecidas por Arte Rupestre. Esta forma de Arte têm o seu valor reconhecido independentemente do seu efetivo valor artístico. A Arte Rupestre é valorizada pela sua antiguidade e ainda bem. Quando a Arte Rupestre nasceu as sociedades humanas eram de bandos de caçadores recolectores e mais simples.
    As sociedades humanas foram crescendo acabando por se tornar mais complexas. Dentro desta complexidade surgem classes dirigentes. As várias formas de Arte acabaram por se tornar uma forma de expressão destas classes dominantes. Aqui encontramos o momento em que Arte e Graffiti se separam. A Arte vai-se desenvolvendo enquanto "oficial" e o Graffiti torna-se "popular".  O Graffiti torna-se  a voz da gente comum e também a voz da religião popular.
    É fácil distinguir entre o Graffiti e os Frescos pintados nas paredes. Entre o Graffiti e os Relevos gravados na pedra quando da construção das estruturas. Mesmo em relação a decorações esgrafitadas a distinção continua a ser relativamente fácil. A distinção entre o "tosco" Graffiti e as diversas formas de Arte não é complicada. 
    No que toca à Função a história é outra. A Função das diferentes formas de Arte vai muito para além da decoração. A Arte tem a mesma Função que o nosso Graffiti. Ambos assumem uma Função Mágico Religiosa. 
    O sucesso do Cristianismo deve-se principalmente à sua mensagem de paz. Mas deve-se também a um grande sincretismo. Nos Templos Cristãos encontramos um mundo de Ideogramas gravados na pedra e pintados nas paredes. Estes Ideogramas foram herdados de religiões anteriores. Há medida que as instituições religiosas se vão tornando mais sólidas passam a suprimir estes Ideogramas. Mas estas crenças antigas  feitas de magia e superstição não desaparecem.  São transportadas para o mundo do Graffiti. Foi o que aconteceu com a Reforma Protestante do século XVI. Muitas Igrejas do Norte da Europa viram-se despidas das suas obras de Arte e do imaginário que representavam. O Graffiti explodiu.
    Na Figura 13 apresentamos a gruta artificial de Royston no Reino Unido repleta de relevos. Na mesma Figura temos um desenho nas paredes do Mosteiro de Belém (Jorge 2017). Dois exemplos muito interessantes da "força" e beleza do Graffiti medieval. 


Figura 13




3 - Funções e Categorias


    A divisão do Graffiti Histórico por Categorias e Funções é uma tentativa de simplificar o seu estudo. Passamos a apresentar categorizações de alguns autores.
    Orlindo Jorge fez um interessante levantamento do Graffiti do Mosteiro da Batalha. Este autor divide o Graffiti na seguinte tipologia em relação às Capelas Imperfeitas:
"É variada a tipologia de grafitos existentes nas Capelas Imperfeitas: antropomórficas, zoomórficas, vegetalistas, arquitetónicas, geométricas, epigráficas (siglas, marcas, assinaturas, inscrições, datas,….), de cálculo (traços de contar, …), navais, bélicas e religiosas. A sua gravação essencialmente é inscrita, embora existam casos incisos. Relativamente aos inscritos ressaltam duas cores: vermelho, tendencialmente ocre, e cinza escuro ou negro. "
    O mesmo investigador completa em trabalho posterior:
- Figuras antropomórficas
- Quadros religiosos
- Grafitos Zoomórficos
- Heráldica
- Embarcações
- Epigráficos e Cálculo
- Relógios de Sol
- Jogos
- Traçarias
    Jose Carnerero de la Paz sobre "El Grafito Medieval en la Torre del Homenaja" (de Olivença) apresenta uma interessante tipologia. Nesta exclui Graffiti que entre no campo da Filologia.
- Marcas e Impressões (marcas de ferramentas, dedos ou unhas, delimitando os elementos pétreos, contagens e de sapatos)
- Religiosas, Protectoras (Peixes, Escadas, o Crismón, a Flôr de Lis, Alquerques, o Nó de Salomão, Pentagramas, a Estrela Tartéssica, a Roseta Hexapétala, Falos)- Animais (o Pavão, o Cervo, a Águia)
- Antropomorfos (o Rei de Maio,....)
- Historiados (Escudos, Barcos,....)
    Matthew Champion apresenta a seguinte tipologia na divisão dos capitulos do seu livro "Medieval Grafitti":
(...)
- Protecting the spirit: ritualistic grafitti
- Compass-draw designs
- The demons on the wall: pentangles
- Swastikas and the Virgin: witch marks
- Crosses of faith
- Magic on the walls: charms and curses
- Voyages over the stones: ship grafitti
- Men of the stones: architectural inscriptions
- The chivalric code: heraldic grafitti
- Mason´s marks
- Men of wealth and power: merchant marks
- Of knights and dragons
- Passing of the hours: Mass dials
- Birds, fish, puffins and pilgrims
- The music of faith
- Death stalk the walls
    Na Figura 14 temos a esquematização dos vários tipos de Graffiti que surgem no Reino Unido segundo o Site "Norfolk Medieval Grafitti Survey". Um excelente exemplo da organização Britânica aplicada ao estudo do Graffiti.
    A partir dos exemplos apresentados, e de várias conversas que vamos tendo na Internet, criámos o Esquema que podem observar na Figura 15. Este Esquema diz respeito ao Graffiti Histórico que a nosso ver abrange também a Proto-História. Neste período temos sociedades já com escrita que ainda não foi decifrada, foi decifrada de forma parcial ou simplesmente "apagada" da História. Muito do Graffiti que encontramos pode até esconder alfabetos antigos sob a forma de letras e Ideogramas hoje esquecidos.
    No nosso Esquema, sempre em construção, apresentamos várias Categorias de Graffiti baseadas na sua Forma e enquadradas pela sua Função. Este enquadramento na Função é já uma primeira interpretação. As Formas são muitas vezes indeterminadas ou sujeitas e diferentes leituras principalmente no que toca aos Ideogramas. Damos como exemplo a dualidade Tabuleiros de Jogo e Ideogramas Mágico Religiosos. 
    As Categorias podem assumir  várias Funções tornando a análise do contexto fundamental. O contexto pode mudar a interpretação de um Grafito. Onde este surge, em meio natural ou urbano, na vertical ou horizontal, em que tipo de edifício e a própria localização no edifício. O facto do Grafito surgir isolado, fazer parte de uma cena ou quadro é vital na sua interpretação. A sua localização e associação a outras Formas, dentro de um quadro ou cena, pode dar importantes pistas sobre a sua Função.
    Ao ar livre os conjuntos de Graffiti são chamados de painéis e podemos encontrar vários num mesmo sítio arqueológico. Estes painéis ganham o nome do topónimo mais próximo na carta militar. Em meio urbano também temos vindo a encontrar "concentrações" de Graffiti em algumas zonas e monumentos. Damos como exemplo as fachadas da Igreja de Santa Maria em Estremoz e as muralhas medievais de Vila Viçosa. Este último com uma grande concentração de Graffiti diretamente em frente do Santuário de NS da Conceição. A estas concentrações de Graffiti em meio urbano de cariz mágico religioso passamos a chamar de "Santuários Mágico Religiosos".


Figura 14



Figura 15




4 - O problema da Datação


    A datação do Graffiti Histórico é decididamente um problema. Em período histórico encontramos no Graffiti todas as Formas possíveis. Estas são reflexo de um imaginário feito da mistura de várias culturas. Esta Formas foram traçadas com as mais variadas técnicas e ferramentas conhecidas pelo Homem. Para complicar mais na maior parte dos suportes temos várias gravações sobrepostas. 
    Em relação ao Graffiti em meio urbano podemos usar a data da construção dos edifícios como baliza. No entanto temos que ter em conta as possíveis reutilizações de elementos pétreos. A situação torna-se mais complicada no Graffiti em afloramentos naturais. A datação do Graffiti Histórico é decididamente um problema.
    O Graffiti pode ser  definido pela ferramenta usada na sua criação. No Reino Unido algumas das Formas geométricas são referidas como "Compass Drawn" ou seja "desenhadas a compasso". Formas que pelas suas linhas curvas podem ter sido desenhadas com um compasso. Estas podem ser mais recentes tendo em conta a ferramenta usada e a complexidade geométrica das Formas.
    Podemos considerar como mais recente o Graffiti desenhado a lápis ou Grafite por este oferecer menos resistência a humidades ou chuva. 
    Por vezes encontramos Graffiti feito por pressão em rebocos e estuques ainda húmidos. Este corresponderá há última vez que as paredes do edifício foram amanhadas.
    No Graffiti histórico encontramos muitas datas que têm que ser interpretadas com cuidado. Estas correspondem muitas vezes a um "momento" dos vários que constituem um painel de Graffiti. Apenas uma Forma no meio de muitas. Esta data não pode ser usada para datar outras Formas ou o próprio painel.
    Podemos datar textos de diversas maneiras. Um texto em arábico, em principio, é anterior à reconquista. Por vezes temos caracteres "góticos" que nos levam para uma Idade Média mais recuada. Os testemunhos têm por vezes referências a eventos ou personalidades que nos podem ajudar a datar. As assinaturas são importantes mas na esmagadora parte dos casos são de pessoas comuns. Isto torna quase impossível a sua identificação ou datação.
    Se tivermos estruturas representadas podemos ter uma ideia da época. Edifícios que sabemos a data de construção. Por exemplo a representação de uma forca em bom estado e pronta a ser usada. Isto diz-nos que o Grafito será anterior à abolição da pena de morte. Encontramos também várias representações de veículos desde carroças aos primeiros automóveis. Pode ser uma ajudano entanto aqui para os nosso lados ainda nos cruzamos com algumas carroças. As embarcações são um excelente fóssil diretor pois surgem com frequência. Estas estão em constante evolução e têm muitas carateristicas especificas. Pelo tipo de embarcação, uma galé a remos ou uma caravela, podemos aferir uma data aproximada.
    Na Figura 16 encontramos vários desenhos de Graffiti Histórico de barcos pelos tempos:
- Na Fonte da Crismina em Cascais por Adolfo Martins e Maria Ramalho.
- No Mosteiro da Batalha por Orlindo Jorge.
- No Castelo de Montalegre por  Barroca e Guedes.
- No Castelo de Montemor-o-Velho e no Mosteiro de Santa Clara-a-Velha por Marco Penajoia.
- Em Mértola por Alessia Amato.
- Em Silves por Varela Gomes.
    Estes dois últimos autores apresentam embarcações mais antigas (canto inferior direito da Figura 16)
    Quando encontramos representações antropomórficas podemos datar pelo traje que usam. Embora esta datação esteja sempre dependente da qualidade do artista. Alguns Grafitos representam estas personagens em "cenas" que podem ser comuns em determinada época.
    Deixamos as palavras de Matthew Champion (2015. p.18) sobre o uso do vestuário na datação de grafitos em dois casos distintos:
    "Human figure may contain depictions of clothing that may help to date an inscription (...) the two figures of a kneeling lady and a armoured knighthave both been dated to the fifteenth century from their costume, in particular the dress and head-dress of the lady (...)
The figure is cleary shown wearing a very distinc style of hat that was fashionable only in the forst half of the fiftennth century (...)".
    Os vários objectos que surgem representados são mais uma pista para datar os Grafitos. Destacamos as armas que infelizmente estão sempre em constante e acelerada evolução.
    A datação de Ideogramas Mágico Religiosos é difícil pois são usados há milénios e continuam a ter força hoje.
    Numa laje de xisto de um banco no exterior da Igreja de S Pedro em Terena encontramos vários Grafitos que foram sendo traçadas ao longo do tempo. Os últimos Grafitos por vezes "respeitam" o espaço de Grafitos anteriores. Na maior parte dos casos sobrepõem-se aos aos anteriores criando uma grande confusão. Na Figura 17 temos uma tesoura e várias navalhas incisas no xisto numa primeira fase. Numa segunda fase a palavra "Slayer" foi lavrada sobre estas tesouras e navalhas. Uma vez que a banda de Trash Metal "Slayer" nasceu em 1981 (obrigado Nick Farnworth) sabemos que a segunda fase é posterior a 1981 e a primeira anterior.


Figura 16

Figura 17





5. Os nosso estudos sobre Ideogramas Mágico Religiosos


Jogos de Tabuleiros

    O primeiro estudo que realizamos dentro do tema do Graffiti Histórico foi sobre os Tabuleiros de Jogo do Concelho de Alandroal. Podem encontrar este estudo AQUI. Na altura interpretamos muitos Ideogramas apenas como a Tabuleiros de Jogo. Um excelente exemplo de como o pensamento evolui pois agora pensamos que vários sejam Ideogramas. Eventualmente faremos um "update" do Post. 
    Na Figura 18 deixamos um interessante caso de um Ideograma Mágico Religioso, na altura interpretado como Tabuleiro de Jogo, protegendo a entrada de um quarto num monte. Este Ideograma é muitas vezes confundido como tabuleiro de Alquerque dos 12.
    Continuamos com a recolha de Tabuleiros-Ideogramas e já identificámos mais três centenas sendo a maior parte inéditos. A nossa recolha incide principalmente no Distrito de Évora mas também temos Tabuleiros dos Distritos de Beja e Portalegre. Encontrámos alguns Tabuleiros inéditos em Lisboa e os primeiros da Ilha da Madeira. Deixamos AQUI o link para o Post sobre alguns dos Tabuleiros inéditos que vamos encontrando
    Na Figura 19 encontramos os Tabuleiros mais frequentes e respetivas maneiras de jogar.
    No Concelho de Alandroal a maior parte dos tabuleiros são do Jogo do Alquerque dos 12. Vinte sete Tabuleiros que correspondem a 49% do total de 57. Estes surgem sob a forma de covinhas que resultam do desgaste das peças. Só encontramos o tracejado de um Alquerque dos 12 e é provavelmente um Ideograma Mágico Religioso.
    Encontramos o tracejado de alguns Tabuleiros do Jogo do Alquerque dos 3. Estes representam 12% do total de Tabuleiros. No entanto a maior parte dos Alquerques dos 3 devem ser Ideogramas. Na maior parte dos casos em que encontramos o tracejado dos Tabuleiros devemos estar perante Ideogramas. 
     O tabuleiro do Jogo do Alquerque dos 16 surge apenas em dois casos respectivamente em Juromenha e Terena. Correspondem a 4% do total. Este tabuleiro apesar de ser muito frequente em Portugal, e nos Concelhos vizinhos, é raro no Alandroal. 
    Os restantes 20 Tabuleiros são indeterminados representando 35% do total.
    As maneiras de jogar são os jogos propriamente ditos. O mesmo tabuleiro ganha uma grande variedade de nomes pois é jogado de diversas maneiras. Podemos dividir os jogos em Jogos de Alinhamento, Jogos de Guerra e Jogos de Caça. Estas maneiras de jogar adaptam-se a vários Tabuleiros de Jogo e Ideogramas Mágico Religiosos. Parece-nos que as Formas antecedem as maneiras e jogar. Esquecida a Função Mágico Religiosa os Ideogramas passaram a Jogos. No entanto muitos Ideogramas são "jogados" como forma de prever o futuro por esse mundo fora.
    Nos Jogos de Alinhamento o objetivo é colocar três peças em linha. O Jogo do Galo que todos jogámos em criança. O Alquerque dos 3 é um pouco diferente. Os jogadores têm quatro peças que colocam à vez no tabuleiro. Quem fizer o três em linha pode retirar uma peça do adversário do tabuleiro. Quem ficar só com duas peças perde. Este jogo encontra-se espalhado por todo o Mundo com vários nomes: Alquerque dos 3, Jogo do Galo, Jogo do Homem, Tic-Tac-Toe, Tapatan, Achi, Three Men Morris.....
    Os Jogos de Guerra são como o Jogo das Damas onde temos duas forças simétricas. Ambos os jogadores têm o mesmo tipo de peças que efetuam o mesmo tipo de movimentos. O jogo tem início com todas as peças no tabuleiro, eliminam-se as peças do adversário saltando por cima. Joga-se assim nos Tabuleiros de Alquerque dos 12 e dos 16. No Alandroal o Alquerque dos 12 ganha o nome de "Jogo dos Pocinhos" devido às covinhas que encontramos numa grande parte dos tabuleiros.
    Nos Jogos de Caça encontramos os adversários com forças assimétricas. Um com uma peça ou peças mais fortes e o outro com mais peças mas menos poderosas. Os objetivos são diferentes, um tem que encurralar o adversário e o outro tem que comer todas as peças do adversário. No Alandroal esta maneira de jogar chama-se "O Gato e os Ratos" (Obrigado António Galhardas). Um jogo que vamos encontrar também no distante Japão.
    Deixamos algumas da conclusões acerca dos Tabuleiros do Concelho de Alandroal (Figura 20). Quase metade dos tabuleiros estão gravados no xisto (48%). Esta é a pedra mais comum por todo o Concelho. Temos alguns tabuleiros gravados no Mármore (35%). Estes são mais visíveis divido à dureza desta pedra. Interessante o grande número de tabuleiro gravados nas baldosas (17%).
    A maior parte dos Tabuleiros de Jogo do Concelho de Alandroal localizam-se na Vila de Alandroal, na Vila de Terena e na Igreja de Santo António de Capelins (67%). Temos assim mais jogos onde existem mais monumentos religiosos. Encontramos a maior parte dos Tabuleiros (72%) no exterior de Igrejas, Ermidas e Capelas, nos adros, bancos dos adros, bancos exteriores e cruzeiros. Quarenta e um tabuleiros localizam-se logo à saída dos templos, grande parte no adro, o religioso e o lúdico bem perto. Pontos de encontro onde se aproveitava para jogar. As más línguas dizem que as mulheres iam à missa e os homens ficavam jogando.....não sei.
    Trinta e oito Tabuleiros encontram-se no centro da Vila do Alandroal ou nos caminhos pontuados por Ermidas (71%). Quem jogava era visto e queria ver quem passava. Esta atividade seria provavelmente aceite pela comunidade. Não sabemos se o padre concordaria com esta hipótese. A Fonte das Bicas apresenta o maior número de Tabuleiros (oito). A sua localização central e frescura tornam-se fatores de peso no calor alentejano. Os tabuleiros que encontramos estão em monumentos posteriores ao século XVI ou que sofreram reconstruções desde então.

Figura 18

Figura 19

Figura 20




Tabuleiros de Jogo versus Ideogramas Mágico Religiosos


    Na Figura 21 apresentamos vários Ideogramas Mágico Religiosos que pela sua Forma geométrica são confundidos com Tabuleiros de Jogo. Pretendemos desmontar este preconceito AQUI.



Figura 21




Ideogramas Mágico Religiosos e a Casa Alentejana


    Os Ideogramas Mágico Religiosos estão por todo o lado na Casa Alentejana. A Religião Popular tem grande continuidade no Alentejo e grande expressão no lar.
    Na Figura 22 temos alguns dos Ideogramas que vamos encontrando por cá. Apresentamos alguns no Post que podem encontrar AQUI. Estes Ideogramas surgem também em vários manuscritos medievais. Vamos depois procurar este mundo escondido à vista de todos nas casas da nossa região. Podem encontrar o Post AQUI.
    A casa alentejana encontra-se muito bem protegida contra o mal. Encontramos Ideogramas Mágico Religiosos guardando portas, janelas, fachadas e portões em casas comuns, edifícios públicos, templos e fortificações. Podemos encontrá-los gravados em vários tipos de pedra, riscados na madeira ou em argamassas. No enquadramento da porta encontramos Cruciformes, Pentagramas e Rosetas Hexapétalas. Na porta em si Losangos e Espirais. Nas janelas temos Pentagramas e Rosetas Hexapétalas. Nas fachadas dos edifícios o Losango é Rei. Em portões também encontramos o Losango e a Espiral.
    Na Figura 23 apresentamos uma casa alentejana com os Ideogramas e o local onde surgem com mais frequência. Verificamos assim que todas as ligações da casa como o mundo exterior se encontram protegidas do mal. Podemos questionar se todos estes Ideogramas são apenas decorações. Não pensamos que seja o caso. A maneira como se repetem, não só nas casas alentejanas, mas nos mais variados suportes. A associação de vários destes Ideogramas assumindo funções claramente religiosas. A continuidade que encontramos no seu uso. Tudo isto faz-nos pensar numa função apotropaica.
    As Chaminés tiveram especial destaque nos nossos estudos  inclusive as do Algarve, Construímos dois Posts sobre o tema que podem encontrar AQUI e AQUI.
    Deixamos alguns dados do primeiro Post relativos a 94 chaminés:
- A data mais antiga é de 1698, são 322 anos de antiguidade. Esta chaminé localiza-se na Aldeia de Motrinos no Concelho de Reguengos de Monsaraz.
- Encontramos 21 datas ainda visíveis: 10% do século XVII, 28% do século XVIII e 62% do século XIX
- As chaminés apresentam datas do século XVII ao XIX num período de três séculos
- 94% são Chaminés de Escuta
- O símbolo omnipresente é a Cruz Latina em 85% das chaminés
- 56% apresentam apenas a Cruz Latina.
- 29% apresentam a Cruz Latina com outros símbolos
- A Roseta Hexapétala surge em 30% das chaminés
- 15% apresentam apenas Rosetas Hexapétalas
- 15% apresentam  Rosetas Hexapétalas com outro símbolos
- A Suástica Lauburu surge em 8% das chaminés
- Na mesma chaminé nunca encontramos mais de uma Cruz Latina
- A Cruz Latina aparece sempre no pano frontal e em posição central
- Em geral os símbolos encontram-se sempre nos panos verticais frontal ou laterais
- Podemos encontrar entre 1 e 6 símbolos numa mesma chaminé
- Podemos encontrar pares de Rosetas Hexapétala e Suásticas Lauburu
- Encontramos outros símbolos: o Pentagrama, ao Nó de Salomão, o Crescente, o Coração e a Roda Solar
    Em relação ao segundo Post apresentamos a Figura 24. Nesta encontramos os vários símbolos que surgem nas nossas chaminés. Neste quadro estão incluídas as chaminés do primeiro trabalho. Ainda na mesma Figura, na coluna do lado esquerdo, podemos ver as associações que mais ocorrem e o número de vezes em que surgem. Fora desta coluna estão os totais de Cruciformes, Hexapétalas e Lauburus.
- O símbolo mais frequente é a Cruz Latina, quando esta surge associada a outros símbolos ocupa sempre o espaço central.
- A Roseta Hexapétala também surge muito seguida do Lauburo.
- Quando associados a outros símbolos as Hexapétalas, Lauburus e Espirais podem surgir em pares.
- A Hexapétala surge várias vezes de lado na chaminé de uma forma que podemos dizer mais "discreta".
- O Lauburu também surge de lado mas em menor número de chaminés.
- A Hexapétala quando associada à cruz surge por vezes na forma de Semente da Vida.
- Cerca de 90% das chaminés são de "Escuta" portanto a maior parte.
- Em 67% das chaminés surge a Cruz Latina (42% do Calvário), sozinha em 43% e associada a outros símbolos em 24% das chaminés.
- A Cruz aparece associada a Rosetas Hexapétalas e Lauburus em 3 chaminés, só ao Lauburu (sempre dois) em 4 chaminés, só à Hexapétala em 16 chaminés. Estas associações entre a Cruz, Lauburus e Hexapétalas representam 16% das chaminés.
- A Roseta Hexapétala é o símbolo que surge mais depois da Cruz. Encontramos Hexapétalas em 25% das chaminés.


Figura 22


Figura 23




Figura 24




Ideogramas Mágico Religiosos escondidos nas "Covinhas"


    Encontramos vários Ideogramas Mágico religiosos escondidos em "Covinhas" (Figura 25). Estamos a construir uma série de Posts sobre o tema que inclui também as Rochas Sagradas. Deixamos o fio da meada AQUI.


Figura 25




Obrigado



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