Antas Capela - Megalithism

 




    Apresentamos uma introdução a um tema  complexo e muito interessante. Baseamos esta apresentação no trabalho de Oliveira, Balesteros e Sarantopoulos (1997): Antas-Capelas e Capelas junto a Antas no território português. Este trabalho pioneiro teve continuidade com os estudos de Ana Costa e Filipa Almeida entre outros dedicados a monumentos específicos. 
    É importante compreender o Património nas suas diversas dimensões. O Megalitismo é também uma religião e das mais antigas do nosso território. Todas as religiões que construíram a nossa Identidade Cultural ainda estão vivas. Sobreviveram naquilo que somos,  na Religião Popular e em vários Sincretismos até ao Cristianismo. 
    A Religião mais antiga que conseguimos identificar na nossa região é o Animismo. Deus era a Terra-Mãe e pedíamos o seu favor através de rochas, árvores, águas e fogos sagrados. Pensamos que muitos Monumentos Megalíticos se encontram perto destes lugares sagrados e principalmente perto de Rochas Sagradas. O Megalitismo (re)sacralizou muitas Rochas Sagradas e as religiões seguintes continuaram este processo até ao Cristianismo. É muito comum a proximidade entre Menires e "Pedras Escorregadias" (visitem o seguinte LINK). 
    Em Reguengos de Monsaraz encontramos dois interessantes topónimos: "Capela de Santa Margarida" e "Rocha da Moura". São duas Rochas Sagradas, duas barrocas muito próximas uma da outra. A Rocha da Moura está fraturada pelo tempo e as fraturas sugerem "escamas". Apresenta também uma rocha mais pequena no topo sugerindo uma "cabeça". Neste autêntico "dragão" encontramos vários nichos na "cauda". Estes nichos permitiam a pernoita de uma pessoa, esta sonhava, os sonhos seriam interpretados prevendo o futuro. Encontramos estes nichos em várias outras Rochas Sagradas. Por vezes temos autênticas "camas" escavadas na rocha. 
    A Capela de Santa Margarida apresenta uma cavidade com espaço para duas ou três pessoas em pé. Aqui encontramos um altar com várias covinhas e outras pedras soltas também com covinhas. Estas serviriam de receptáculos para oferendas, fazer fogo ou suportar velas. Uma espetacular Capela Rupestre. Em redor destas duas Rochas Sagradas encontramos várias estruturas pétreas e várias Antas.
    Encontramos aqui um caso de estudo de uma Rocha Sagrada (Rocha da Moura ou Rocha dos Antigos) associada a um Santuário de Covinhas e posteriormente (re) sacralizada pelo Cristianismo (Capela de Santa Margarida na Toponímia). 
    Muito perto, na Herdade do Barrocal, encontramos outro exemplo num pequeno oratório de covinhas provavelmente associado ao conjunto. Muito interessante esta relação das covinhas com os Monumentos Megalíticos. 
    Outro exemplo foi partilhado por Esmeralda Lucena a quem agradecemos. Uma interessante Ermida do Senhor da Pedra nas Perolivas (Reguengos de Monsaraz).  Segundo as lendas, partilhadas pelo avô de Esmeralda, numa barroca ficaram as pegadas de um rebanho e do seu pastor feitas quando a rocha ainda era mole. Debaixo da rocha existiria também um tesouro de ouro. Lendas que surgem em barrocas com covinhas ou degraus escavados na pedra. Mais um Santuário esquecido que temos que procurar.
    Na Figura 1 apresentamos a Rocha de Moura Na Figura 2 temos a Capela de Santa Margarida. Na Figura 3 o Oratório da Herdade do Barrocal. Na Figura 4 vemos as pistas da Toponímia na Carta Militar e uma Planta antiga. A Figura 5 é mais complexa e apresenta os Monumentos e a sua relação com as várias Antas próximas. A Rocha da Moura ocupando um lugar central. Na Figura 6 reparem quem acompanha Santa Margarida na iconografia Cristã. 
    Os Menires são muitas vezes confundidos com Rochas Sagradas. Infelizmente no meio académico não se reconhece o Animismo nem as tradições associadas. Como muitas destas tradições ainda estão vivas são  interpretadas como contemporâneas. Na nossa região várias Rochas Sagradas são erroneamente interpretadas como pertencendo à Cultura do Megalitismo. Deixamos o exemplo da Pedra Alçada no Concelho de Alandroal, Santa Margarida e a Rocha dos Namorados no Concelho de Reguengos de Monsaraz. Estas Rochas Sagradas apresentam covinhas no monumento em si ou em altares perto dos monumentos. Na Figura 7 apresentamos a Rocha dos Namorados onde as tradições ainda estão vivas. Podemos também observar a (re)sacralização cristã do monumento. Na Mesma Figura temos o Menir (ou Estela) e Ermida de S Bartolomeu do Mar no Concelho de Esposende (Foto de "The Megalithic Portal"). Ainda na mesma Figura observamos a (re)sacralização do Menir de Saint Uzec e o Menir de Saint Julien, na Catedral de Mans, fazendo parte do Santuário. Neste último caso encontramos um paralelo para as Antas-Capelas. Desenvolvemos alguns temas relacionados com Menires, Rochas Sagradas e Covinhas no seguinte LINK.
    Na Figura 8 vemos sobrevivências de tradições antigas agora em Antas. Tradições que continuam dentro da Religião Popular até hoje. Do lado esquerdo da Figura vemos a Anta da Pedra dos Mouros no Concelho de Sintra. Esta terá sido usada como "Pedra Escorregadia" por mulheres em busca de Fertilidade. Mais uma vez temos o termo "Mouros" que se refere aos antigos e não aos Islâmicos. Do lado direito da Figura vemos um dos esteios da Anta do Freixo usada como altar e repleta de covinhas. Várias destas covinhas parecem formar Ideogramas Mágico religiosos que esperamos desenhar num futuro próximo. 
    Compreendemos assim que muitos Lugares Sagrados começaram em afloramentos rochosos de alguma forma expressivos sendo depois re(sacralizadas) com monumentos Megalíticos. Estes lugares tiveram depois continuidade em várias outras religiões. Na Figura 9 (plantas de Victor Gonçalves) observamos Antas do Concelho de Reguengos de Monsaraz que viram Monumentos da Idade dos Metais anexados. Templos Romanos também re(sacralizaram) lugares sagrados tendo depois continuidade com Ermidas Cristãs. O melhor exemplo será a destruída Ermida de S Miguel da Mota no Concelho de Alandroal. Outro exemplo interessante será o Santuário de NS do Rosário no Concelho de Reguengos de Monsaraz. Na nossa região existem várias Ermidas que re(sacralizam) Rochas Sagradas. Por exemplo a Ermida de Santo Aleixo no Concelho de Redondo ou a Ermida de S Pedro no Concelho de Portel. Todas as Ermidas Cristãs que referimos foram provavelmente Qubbas Islâmicas. Um tema que temos vindo a estudar e do qual apresentaremos uma introdução num futuro Post. Ufa Ufa
    Grande parte das Antas intervencionados pela Arqueologia encontravam-se muito destruídas. Intervenções mais antigas nos monumentos procuravam mais o espólio do que a leitura do monumento no seu todo. Uma Anta é um monumento complexo que ainda não compreendemos na totalidade. Há vários elementos externos como Menires ou Estelas e várias estruturas anexas. As Antas eram autênticos Santuários. 
Não podemos entender as Antas apenas como monumentos funerários pois elas são muito mais. São acima de tudo Templos onde se realizavam vários rituais que juntavam a família alargada ou até a comunidade. Encontramos um interessante paralelo entre Templos Megalíticos e Templos Cristãos. No Cristianismo só a partir do século XIX começamos a enterrar os mortos em cemitérios. Antes desta data os mortos eram enterrados dentro e em redor dos Templos. Uma imensa continuidade.
    Vemos as Antas-Capelas como mais do que uma mera re(sacralização) por parte do Cristianismo. As Antas-Capela representam um incrível e milenar Sincretismo Arquitetônico. Num mesmo local sagrado podemos encontramos uma Rocha Sagrada, um monumento Megalítico, um Templo Romano, uma Qubba Islâmica e, num último momento, a Ermida Cristã. A maior parte das Ermidas Rurais Cristãs respeitam esta continuidade. Uma situação que levou ao nascimento das mais incríveis lendas para justificar localizações complicadas. Por vezes a Ermida Cristã destruiu outros monumentos e reutilizou-os na sua estrutura. O caso mais flagrante será a já referida Ermida de S Miguel da Mota no Concelho de Alandroal (Figura 10). Uma Ermida "feita de" Aras Romanas. Foi desmantelada por Leite de Vasconcelos e levada para Lisboa. Um crime que espoliou o Alentejo do seu Património. Destruiu também o maior exemplo de Sincretismo Arquitetônico numa Ermida Rural. 
    Pensamos que muitas Ermidas Rurais estejam construídas em cima de Antas. Simplesmente já não vemos os Monumentos Megalíticos, como já não vemos as Qubbas Islâmicas ou os Templos Romanos. No Alentejo as Ermidas Rurais são autênticas bonecas "Matrioskas". Um espetacular Sincretismo Arquitetônico e uma imensa Continuidade de espaços sagrados.
    Verificamos que na maior parte das "sobreviventes" Antas-Capelas, ou naquelas que ainda vemos efetivamente o monumento Megalítico, também observamos a possível Qubba. O exemplo mais interessante será o da Ermida de S Bento do Mato no Concelho de Évora. Neste lugar sagrado a Ermida Cristã como que "abraçou" uma Anta e uma pequena Qubba (Figura 11).

Figura 1

Figura 2

Figura 3

Figura 4

Figura 5

Figura 6

Figura 7


Figura 8


Figura 9

Figura 10

Figura 11


    Passamos agora a apresentar algumas Antas-Capelas:
- Anta-Capela de S Dinis em Pavia no Concelho de Mora (Figura 12).
- Anta-Capela de NS do Livramento em S Brissos no Concelho de Montemor-o-Novo (Figura 13).
- Anta-Capela de NS do Monte em Penela da Beira no Concelho de Penedono (Figura 14  com foto do Site "Megalithic"). A planta apresentada foi retirada do trabalho de Agostinho Ferreira (1985, p.45)  sobre o monumento.
- Anta-Capela de S Fausto no Concelho de Torrão (Figura 15 com fotos de Jorge de Oliveira). Do lado direito temos um esquema retirado do estudo de Andreia Alves (2018, p.71) sobre o monumento. Um esquema muito interessante que reforça o que vimos dizendo e apoiado num caso de estudo. Excelente.  
- Anta-Capela de Santa Maria da Madalena na Igreja das Alcobertas no Concelho de Rio Maior (Figura 16 com fotos do Blogue "Cascalenses").
    O fenómeno das Antas-Capelas não se resume a Portugal. Na Figura 17 (Fotos retiradas da Internet e informação de Pascal Pannetier) apresentamos a Capela dos Sete Santos em França (em baixo) e a Capela de Santa Cruz em Espanha (em cima). Ambos os Templos foram construídos em cima de Antas. 
    Encontramos também várias Ermidas perto de Antas. Na Figura 18 apresentamos a Ermida de NS da Conceição no Concelho de Estremoz. Na Figura 19  temos a Capela de Santo Amaro no Concelho de Figueira da Foz (planta do Blogue "Estado das Antas e Afins") e a Ermida de S Gens no Concelho de Nisa (foto de João Quinteiro).
    Várias Antas sobreviveram até hoje apenas com a Câmara onde encontramos uma porta, por vezes até uma janela e alguns elementos construtivos. São quase sempre consideradas como abrigos de pastores ou arrumos. Pensamos que estas podem ter desempenhado funções de Capelas ou de Eremitérios. Aqui vivia um Homem Santo, um Morábito no mundo do Islão, um Monge no mundo Cristão. Na Figura 20 apresentamos a Anta da Vidigueira, em cima, Concelho de Redondo, com a sua janela localmente conhecida por "buraco da alma". São interessantes as pistas que a oralidade nos traz. Na mesma Figura, em baixo, temos a Anta dos Pombais no Concelho de Castelo de Vide. Na Figura 21 vemos a Anta do Estanque no Concelho de Montemor-o-Novo. Esta pode ter sido mais uma Anta-Capela tendo parte da estrutura sido assimilada pela construção recente. Na mesma Figura vemos um esboço da estrutura antiga na parede da estrutura mais recente confirmada na foto antiga. Vemos também uma possível porta entaipada dentro da Anta. Na Figura 22 deixamos mais exemplos em Portugal (fotos retiradas da Internet). 
    As Antas são Templos da religião do Megalitismo. As Antas-Capelas são reflexo da enorme continuidade de espaços sagrados desde o Animismo até ao Cristianismo. Antas-Capelas  que observamos hoje são apenas a "ponta do iceberg" de um incrível Sincretismo Arquitetônico. As Antas-Capelas são muito mais do que uma re(sacralização) cristã. São acima de tudo uma evidência da força de uma Religião Popular. Esta prevalece, principalmente no mundo rural, percorrendo milénios de fundamentalismo religiosos. 
 



Figura 12

Figura 13

Figura 14

Figura 15

Figura 16

Figura 17

Figura 18

Figura 19

Figura 20

Figura 21

Figura 22


Bibliografia

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Gomes (1994) - Menires e Cromeleques no complexo cultural megalítico português - Trabalhos recentes e estado da questão.

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Oliveira (1995) - Monumentos Megalíticos da Bacia Hidrográfica do Rio Sever (Marvão, Castelo de Vide, Nisa, Valência de Alcântara, Herrera de Alcântara e Cedillo) - 3 Volumes.

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Oliveira e Torres (2021) - O Abrigo do Ninho do Bufo - O Painel da Parturiente e o seu contexto (Marvão - Portugal)

Pina (?) - A Anta da Azinheira (Reguengos de Monsaraz).

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Rocha (2009) - A Anta de Santiago Maior (Alandroal): a recuperação de um monumento destruído.

Rocha (2022) - Megalitismo, destruições e classificações: perspectivas e problemáticas sobre o estado da questão no Alentejo.







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